sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

«Quem tem ouvidos, oiça!»

Um dos clientes do café da D. Maria, sempre que é interpelado por alguém dos presentes e o momento é favorável, aproveita para ir esclarecendo os seus interlocutores quanto às questões da fé ou da religião.

Aproximando-se o início de mais um ano catequético, procurou ele interessar-se que a Anaísa e o Mário, netos da D. Maria, passassem a frequentar a catequese, e quando já esta tinha começado havia algumas semanas e eles continuavam sem a frequentar, estando os dois para iniciar esse itinerário, empenhou-se nesse sentido. Havia porém uma questão importante a considerar quanto ao Mário, sendo a dedicada avó aconselhada a apresentar pessoalmente essa questão ao Pároco.

Quando foi à igreja, acompanhada pela D. Rosa, que muito viria a admirar-se pela mudança que nela constatou, foi recebida pelo seu cliente, que ali é catequista, apresentando-a ao Pároco, por também ele ter sido aconselhado nesse sentido.

Depois disso, quando o catequista voltou a estar no café, a D. Maria não sabia como manifestar tanto agrado. Havia muitos anos que se mantinha afastada da Igreja, e este contacto, mais pela forma como foi acolhida pelo Pároco, deixou nela o espaço aberto ao regresso, tanto que disse que passaria a ir à Missa todos os Domingos, coisa que até então dizia não poder por causa do café…

Alguns dias antes, a Anaísa e o Mário tiveram mais um mano. Para a extremosa avó, já esse facto fora uma grande bênção, o que também deve ter contribuído para o resultado do bem-estar interior alcançado com a ida à igreja.

Dois ou três dias depois, viajavam felizes os dois pequenos catequizandos com os avós e, quando, na A-15, um condutor entendeu deixar a faixa mais à direita no momento em que outro veículo estava a passar por ele, deu-se o acidente.

Mobilizados os meios necessários para o local, quando o condutor do reboque chegou, perguntou aos agentes da autoridade se a ambulância já tinha levado os mortos, não porque tivesse conhecimento do tipo de vítimas que resultaram do acidente, mas pelo que deduziu depois de verificar em que estado ficou o carro em que seguiam aquelas crianças e seus avós.

Foi um estranho acidente, como estranho foi o seu resultado. A avó dos meninos, que era quem conduzia, depois de muitos anos a falar mal dos padres, até ia a cantarolar, coisa que os netos nunca tinham ouvido, e cantava um cântico a Nossa Senhora…

Mesmo ficando o café a duas ou três centenas de metros da igreja, nunca a D. Maria lá tinha entrado, e como dissera ao cliente, mal transpôs a porta da entrada, gostou muito do que viu, pois, sendo uma igreja nova, estava muito ao seu gosto. Tudo a impressionou muito positivamente, até o simples gesto do catequista, o de ajoelhar quando passava diante do sacrário…

Algum tempo antes do acidente, ainda antes de o bebé ter nascido, o cliente foi mais uma vez catequista e a D. Maria a única destinatária dessa catequese, que teve como tema os Anjos-da-guarda e a sua solícita e amorosa missão.

Porque não valerá a pena continuar com qualquer consideração, remeto o leitor para as palavras com que Jesus encerrou vários dos seus ensinamentos: «Quem tem ouvidos, oiça!» Sim, porque os mortos a que se referia o condutor do reboque, não existiram naquele acidente, do qual todos saíram sem um único arranhão…