Já não me recordo do que lhe disse quando me dirigi a ela, mas terá sido algo relacionado com o acolhimento que lhe quis prestar.
Momentos depois, porque eu tinha ido a outras salas, creio que, à procura de alguém que estava escalado para as leituras daquele Domingo, vejo-a no espaço que fazia de antecâmara a essas outras salas, ficando eu com a ideia de que talvez me tenha seguido, por eu ser a pessoa que lhe dera atenção e quiçá por ser isso mesmo que ela buscava.
Mal eu parei junto dela, sem que lhe tocasse, porque anteriormente tinha-o feito, cai no chão, como se tivesse desmaiado. Dois outros membros da comunidade foram solícitos a acudir, para ajudá-la a recompor-se.
Rápido nos apercebemos, porém, de que não se tratava de uma questão qualquer de saúde. A pobre começa a agitar-se e a emitir sons como um animal enraivecido, mas num timbre de voz que não era o seu, era mais grave.
Ali estávamos três, de entre os vários membros da comunidade empenhados nos vários serviços da paróquia, desde os litúrgicos à pastoral, mas que éramos acima de tudo três homens de oração. Talvez por isso tenha havido da parte de cada um uma resposta natural ao quadro que se nos apresentou, sem que aquilo nos espantasse, nem mesmo causasse uma grande admiração.
Começámos a rezar. Inicialmente, eu fiz oração mental, e sem conhecimentos ou preparação para tal, com alguma ingenuidade à mistura, sustentando-me apenas na fé da Igreja, ousei acreditar que podia ordenar ao mal que cessasse, em vez de fazer a oração de petição ou súplica ao Pai. Enquanto isso, e porque naquele pequeno grupo de três havia dois ligados ao Renovamento Carismático, um destes disse ao outro para rezarem em línguas, o que fizeram enquanto o terceiro evocava o poder de Cristo sobre o mal e a Sua vitória pela Cruz.
Creio que foi nessa altura que a criatura começou a rir-se e a fazer troça da cruz, não obstante o facto de já estar a ser empunhado diante dela um crucifixo. Foi nesse momento que, aquilo que até ali para mim era uma suspeita passou a certeza. Foi-me dado ver claramente quem tinha diante de mim, quando a criatura, com um orgulhoso tom de vitória, afirma alto e em bom som:
− O mundo é meu!... Quem Te crucificou fui eu! Eu, crucifiquei-Te! Eu domino o mundo! (1)
Iluminado pelo Espírito Santo ou por que visse que era tarefa demasiada para nós, um dos três pediu que trouxessem água benta, enquanto assistíamos àquela gabarolice. E quando estava para lhe ser administrada, sem que tivesse abrandado o empenhamento de cada um, o “discurso” foi interrompido pelas seguintes palavras:
− Isso não, água benta não!... Isso arde!..
E por desconforto, rejeição ou mesmo dor, quando recebeu a água benta, com um «aaah!…», contorcendo-se, deu por terminada a sua “apresentação”.
O que se seguiu foi para mim um momento comovedor. A pobre mulher, com voz suave e suplicante, começou a rezar o Credo, vindo a levantar-se como se nada tivesse acontecido, a não ser um aparente cansaço.
Procurei mais tarde saber desta filha de Deus, por me inquietar com o seu sofrimento. Soube que morava para os lados da pessoa que me disse conhecê-la, vindo depois a perguntar por ela aos vizinhos do prédio onde morava, que me disseram já não estar ali, que tinha sido internada no Hospital Júlio de Matos. Obviamente que não lhes disse nada sobre os motivos por que a procurava, dada tamanha incompreensão que hoje existe sobre a área da demonologia, para a qual muito contribui o modernismo (2) que se instalou na Igreja de Cristo e que chega mesmo a negar a existência do diabo, incorrendo em heresia quem tal coisa defende, ao negar um dos quarenta e três Dogmas (3) da Igreja.
Na minha paróquia, na altura, havia água benta para uso dos fiéis. A partir do momento que foi inaugurada a igreja, como parece acontecer em todas as igrejas mais recentes e até nas antigas mas com padres modernos (pese embora alguns já tenham mais do que idade para terem juízo), a água benta já não se encontra…
Depois do que acabo de expor, pergunto aos senhores bispos e aos senhores padres:
Quem é que se revela mais interessado em que não haja água benta nas igrejas? Porque não reparais então o mal, diminuindo assim o sofrimento de Nosso Senhor, que vos vê impedir os seus filhos de acederem a este sacramental e seus benefícios?
Vós, pregadores da Palavra, atendei ao pedido cada vez mais actual de S. Pio X, que, na sua ENCÍCLICA PASCENDI DOMINICI GREGIS sobre as Doutrinas Modernistas, aí vigorosamente condenadas, a todos diz: «Queira Deus secundar os Nossos desígnios, e auxiliarem-nos todos quantos têm verdadeiro amor à Igreja de Jesus Cristo».
Queira pois, algum de vós, curadores de almas, deixar-se mover pela compaixão em favor desta filha de Deus. Fico à espera de algum contacto, para o endereço indicado ao início da página.
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(1) A ordem das frases pode não ter sido exactamente a mesma.
(2) Para algum leitor menos esclarecido, Dogma é uma verdade declarada como tal pelo Sagrado Magistério da Igreja, depois de muito estudo, debate e oração sobre matéria até então controversa. Pode dizer-se, por isso, que é uma verdade revelada por Deus, como tal, o Dogma é imutável e definitivo (não pode ser revogado).
(3) Corrente teológica/filosófica condenada pela Igreja, que actua bem dentro do seu seio.