sexta-feira, 3 de abril de 2009

A hipocrisia da crise

Infelizmente, parece que até já nem há espaço para falarmos de outras coisas senão da crise. E sobre ela, ocorre-me partilhar com o leitor duas questões, ou pensamentos:

Onde, ou por quem é criada a crise e, quem é responsável por que ela se mantenha?

Resposta à primeira questão:

A crise económica nasce, desenvolve-se e amadurece, no coração dos soberbos, acabando por se instalar na sociedade por via dessa malévola influência que neles se gerou. E como tendencialmente são os soberbos que atingem os lugares cimeiros do poder, depois de, obviamente, nada se importarem de quantos têm que pisar, nem do número de falcatruas para o alcançarem, o nefasto impacto de tudo quanto fazem, vai aumentando à medida que a engrenagem do sistema económico-social mais deles vai dependendo.

Quanto à responsabilidade por que ela se mantenha, já não é apenas de uns, mas, diria mesmo, de todos, ainda que uns mais responsáveis do que outros. Fugiria à verdade se não dissesse que, em meu entender, são os governos o maiores responsáveis por qualquer crise, se não, vejamos:

As políticas do Governo Comunitário para a actividade económica que agora representa cerca de 6% do PIB, a agricultura e outros sectores sucedâneos, impuseram medidas tão escandalosas, que acabaram por estrangular a actividade dos pequenos e médios agricultores. Por outro lado, para os grandes grupos económicos como a indústria petrolífera, a banca, telecomunicações, e outros grandes operadores, cotados ou não em bolsa, nenhum governo se atreveu a impor quotas para os lucros que chegaram em alguns casos aos milhares de milhões de lucro anual, como a EDP, que há algumas semanas declarou que teve mil milhões de lucro no ano passado. Se fossem impostos limites de riqueza válidos tanto para cada cidadão individualmente, como para as empresas, rapidamente deixaria de haver miséria, medidas que teriam que ser acompanhadas da obrigatoriedade de toda a gente ter que trabalhar.

Por que razão os governos nunca pensaram nisto? Creio que é demasiado óbvio perceber que, de facto, tais medidas nunca poderão ser tomadas. Senão, como poderiam os necrófagos sociais alimentarem a sua cada vez mais insaciável ganância?

Não temos todos, sobejo conhecimento de leis que parecem mesmo feitas à medida do “freguês que se segue”, que aparentam algumas reclamadas alterações, mas que não passam de alguns acertos que só garantem a manutenção do sistema, tendo em vista os altos cargos que passarão a ocupar depois de deixarem as funções governamentais?

E não vamos também sabendo da criação de empresas autárquicas e institutos públicos, cuja existência se justifica para garantir os altos vencimentos a muitos compadres que não podem trabalhar por nada saberem fazer?

Não vamos nós sabendo que há presidentes de assembleias gerais de empresas que recebem mil contos por estarem presentes numa reunião, como é o caso, há dias noticiado, da BRISA a pagar a António Vitorino?

Alargando o campo de análise, porque dos corações soberbos comecei a falar e estes não têm nacionalidade, não vimos o escândalo de uma empresa ou grupo financeiro nos EUA que recebeu do Estado 185 mil milhões de dólares para não se afundar, e 175 mil milhões foram distribuídos em prémios aos seus administradores? Então não é de erguer uma estátua àqueles administradores, por terem conseguido na empresa um trabalho tão meritório que mereceram como prémio, vários milhões de dólares cada um?

E então o Presidente da Câmara de Oeiras, que disse em julgamento que não tinha consciência que constituía uma fuga ao fisco, o facto de “despachar” (o termo é meu) mais de um milhão, trezentos e vinte e um mil euros, para um banco suíço, não declarando tal valor ao fisco nem ao Tribunal Constitucional? Vejam só, que eu até cheguei a duvidar da seriedade do homem e, afinal, não passou de um acto ingénuo de pessoa simples…

Muito mais poderia dizer sobre as principais razões da crise que está a afectar a economia mundial, mas fico-me por aqui, certo de que terei dado as pistas necessárias para que o leitor possa entender o que eu penso quanto aos principais responsáveis. Mas não queria terminar sem aludir, a par dos milionários vencimentos e equiparadas indemnizações e pensões de reforma de tantos desavergonhados e corruptos, a esse outro escandaloso sorvedouro de riqueza, que é constituído pelos meninos de ouro que são os jogadores de futebol, aos quais deveria também ser imposto um montante máximo, e para haver alguma justiça, esse teto teria que estar de acordo com aquilo que na opinião dos pobres seria aceitável.

Dizer que tudo isto é um escândalo, é ser exageradamente brando, quando na verdade estamos diante do mais hediondo crime económico-social contra milhões de seres humanos que só nesta pomposamente dita União Europeia vivem entre a subsistência e a miséria, já para não falar de outras partes do mundo, onde existe um número bem maior de vítimas dos criminosos soberbos que tudo dominam.

Concluo, certo de que poderei estar a ser exagerado ao admitir que há corruptos neste país, uma vez que a justiça nada provou ainda, a não ser um caso também há dias noticiado de dois elementos da GNR que se corromperam por 25 euros, cabendo-lhes em julgamento uma pena de dois anos de prisão. Afinal, ainda há alguns corruptos, assim como há justiça para eles! Só espero que ainda se venha a conseguir justiça também para os que "não são" corruptos, aqueles que o povo designa de “os grandes”, e que são apenas, coitados, malabaristas da política e da finança.