A história
de um evangélico baptista que encontrou a plenitude da fé no catolicismo
28.06.2014
Anthony Baratta
Aleteia
No dia seguinte à quarta-feira de cinzas de 2012, eu
liguei para a minha mãe do meu dormitório no Seminário Teológico Batista do Sul
e contei a ela que estava pensando em me tornar católico.
"Você não vai se tornar católico, você só sabe
que não é baptista",
disse ela.
"Não, mãe, eu acho que não é só isso".
Pausa. "Ah, meu Deus", ela suspirou.
Eu comecei a chorar.
Não tenho como enfatizar o suficiente o quanto eu
odiava a simples ideia de algum dia virar católico. Fui reticente até o último instante. Poucos dias antes
de abandonar a Igreja baptista, eu cheguei a enviar um sermão para um concurso;
estava decorando o Salmo 119 para me convencer da “sola scriptura”; marcava
reuniões com professores para ouvir os melhores argumentos contrários ao
catolicismo; lia livros protestantes sobre o catolicismo, de propósito, em vez
de livros de autores católicos.
Além disso, eu sabia que ia perder o subsídio para
moradia e teria que devolver o valor da bolsa se abandonasse o seminário, sem
falar da decepção para a minha família, amigos e para a dedicada comunidade da
igreja.
Mas quando eu tentava estudar, desabava na cama. Tudo
o que eu queria era gritar com o livro: "Quem disse?".
Eu tinha vivido uma grande mudança de paradigma na
minha maneira de pensar sobre a fé. E a questão da autoridade apostólica surgia
mais forte do que nunca.
Mas vamos voltar alguns anos no tempo.
Eu cresci num lar protestante evangélico. Meu pai se tornou pastor
quando eu estava na quarta série. Durante o ensino médio, eu me apaixonei por
Jesus Cristo e pelo seu precioso Evangelho e decidi-me tornar pastor também.
Foi nessa época que eu endureci a minha convicção de
que a Igreja Católica Romana não seguia a Bíblia. Quando perguntei a um amigo
pastor por que os católicos diziam que Maria permaneceu virgem depois do
nascimento de Jesus, se a Bíblia diz claramente que Jesus teve
"irmãos", ele simplesmente fez uma careta: "Porque eles não lêem
a Bíblia".
O livro “Don’t Waste Your Life” [Não desperdice a
vida], de John Piper, me fez enxergar um chamamento ao trabalho missionário.
Passei o verão seguinte evangelizando os católicos na Polónia.
Fiquei surpreso quando visitei os meus pais, depois
disso, e encontrei um livro intitulado “Born Fundamentalist, Born Again
Catholic” [Nascido fundamentalista, renascido católico] em cima da mesa do meu
pai. Por que o meu pai estaria lendo uma coisa dessas? Fiquei curioso e, como
não tinha trazido nada para ler em casa, dei uma olhada no livro.
As memórias de David Currie, que abandonou a sua
formação e o seus ministérios evangélicos, foram desconfortáveis para mim. Sua defesa
sem remorsos de doutrinas controversas sobre Maria e o papado eram chocantes;
eu nunca tinha pensado seriamente que os católicos tivessem argumentos sensatos
e embasados para defender essas crenças.
A presença do livro na mesa do meu pai foi explicada
com mais detalhes alguns meses depois, quando ele me ligou e disse que estava
retornando ao catolicismo da sua juventude. Minha resposta? "Mas você não
pode simplesmente ser luterano ou algo assim?". Eu me senti traído,
indignado e furioso. Nos meses seguintes, servi como pastor de jovens na minha
igreja local e, nos tempos livres, lia sobre o porquê de o catolicismo estar
errado.
Foi quando encontrei um artigo que falava de uma
"crise de identidade evangélica".
O autor pintava um retrato de jovens evangélicos crescendo num mundo
pós-moderno, desejosos de encontrar as suas raízes na história e sedentos do
testemunho motivador de quem permaneceu firme em Cristo durante épocas
cambiantes e conturbadas. Mas, na minha experiência, a maioria das igrejas evangélicas
não observava o calendário litúrgico, o credo dos Apóstolos nunca era
mencionado, muitos cantos só foram escritos a partir de 1997 e, quando se
contava algum relato sobre um herói da história da Igreja, invariavelmente se
tratava de alguém posterior à Reforma. A maior parte da história cristã,
portanto, passava em branco.
Pela primeira vez, eu entrei em pânico. Encontrei uma
cópia do catecismo católico e comecei a folheá-lo, encontrando as doutrinas
mais polémicas e rindo das tolices da Igreja católica. Indulgências?
Infalibilidade papal? Esses disparates, tão obviamente errados, me
tranquilizaram no meu protestantismo. A missa me soava bonita e a ideia de uma
Igreja visível e unificada era atraente, mas... à custa do Evangelho? Parecia
óbvio que o demónio construía uma grande organização para afastar muita gente
do céu.
Sacudi a maioria das minhas dúvidas e aproveitei o
restante do meu tempo me divertindo com o grupo de jovens e compartilhando a
minha fé com os alunos. Qualquer dúvida, resolvi, seria tratada no seminário.
Comecei as minhas aulas em Janeiro, com a mesma emoção
de um fanático roxo por futebol indo para a final da Copa do Mundo. As aulas
eram fantásticas e eu pensei que tinha finalmente me livrado de todos aqueles
problemas católicos.
Mas, poucas semanas depois, mais dúvidas me
assaltaram. Estávamos estudando as disciplinas espirituais, como a oração e o
jejum, e eu fiquei cismado com a frequência com que o professor pulava de São
Paulo para Martinho Lutero ou Jonathan Edwards ao descrever vidas admiráveis
de piedade. Será possível que não aconteceu nada que valesse a pena nos
primeiros 1500 anos do cristianismo? Este salto na história continuaria me
incomodando em muitas outras aulas e leituras propostas. A maior parte da história
da Igreja anterior à Reforma era simplesmente ignorada.
Eu logo descobri que tinha menos em comum com os
padres da Igreja primitiva
do que eu pensava. Diferentemente da maioria dos cristãos na história, a
comunhão sempre tinha sido, para mim, apenas um pouco de pão e suco de uva
ocasionais e o baptismo só me parecia importante depois que alguém tinha sido
"salvo". Esses pontos de vista não apenas contradiziam grande parte
da história da Igreja, mas, cada vez mais, evocavam passagens desconfortáveis da
Bíblia que eu sempre tinha desdenhado (João 6, Romanos 6, etc.).
Outras perguntas que eu tinha enterrado começaram a
reaparecer, mais ferozes, exigindo uma resposta. De onde foi que veio a Bíblia?
Por que a Bíblia não se autoproclamava "suficiente"? As respostas
protestantes, que tinham-me bastado no passado, já não eram satisfatórias.
Foi lançado nesse tempo um vídeo viral de Jefferson
Bethke no YouTube, "Por que eu odeio a religião, mas amo Jesus". O
jovem tinha boas intenções, mas, para mim, ele apenas validava o que o Wall
Street Journal tinha chamado de "perigosa anarquia teológica dos jovens
evangélicos", tentando separar Jesus da religião e perdendo muito no
processo.
O ponto de inflexão foi a quarta-feira de cinzas. Uma
igreja baptista em Louisville realizou uma cerimónia matutina e muitos
estudantes compareceram às aulas com as cinzas ainda na testa. Na capela,
naquela tarde, um professor famoso pelo empenho apologético anticatólico expôs
a beleza dessa tradição milenar.
Depois disso, eu perguntei a um amigo do seminário por
que a maioria dos evangélicos tinha rejeitado essa linda tradição. Ele
respondeu com alguma coisa sobre fariseus e "tradições meramente
humanas".
Eu balancei a cabeça. "Não, eu não consigo
mais".
A minha resistência ao catolicismo começou a se
desvanecer. Eu me sentia atraído pelos sacramentos, pelos sacramentais, pelas
manifestações físicas da graça de Deus, pela Igreja una, santa, católica e
apostólica. Não havia mais como negar.
Foi no dia seguinte que eu liguei para a minha mãe e
contei a ela que estava pensando em me tornar católico.
Faltei às aulas da sexta-feira. Fui para a biblioteca
do seminário e olhei os livros que eu tinha-me proibido de olhar, como o
catecismo e os últimos textos do papa Bento XVI. Eu me sentia como se estivesse
vendo pornografia. No sábado, fui à missa das cinco da tarde. O grandioso
crucifixo da igreja me fez lembrar de quando eu considerava os crucifixos um
prova de que os católicos não tinham mesmo entendido a ressurreição.
Mas desta vez eu vi o crucifixo de modo diferente e
comecei a chorar. "Jesus, meu Salvador sofredor, Tu estás aqui!".
A paz tomou conta de mim até a terça-feira, quando a
realidade me atropelou. Fico ou vou? Fiz vários telefonemas em pânico: "Eu
literalmente não tenho ideia do que eu vou fazer amanhã de manhã".
Na quarta-feira de manhã, eu acordei, abri meu computador
portátil* e digitei "77 razões pelas quais estou deixando de ser
evangélico". A lista incluía coisas como a “sola scriptura”, a
justificação, a autoridade, a Eucaristia, a história, a beleza e a continuidade
entre o Antigo e o Novo Testamento. Os títulos e os parágrafos fluíam dos meus
dedos como a fúria das águas que explodem uma represa secular.
Poucas horas depois, em 29 de Fevereiro de 2012, eu
saí de Louisville para evitar confundir mais alguém e esperando que eu próprio
não estivesse cometendo um erro.
Os meses seguintes foram dolorosos. Mais do que
qualquer outra coisa, eu me sentia envergonhado e na defensiva, indagando de
mim mesmo como é que a minha identidade e o meu plano de carreira tinham-se
deixado abalar tão rapidamente. Mesmo assim, eu entrei para a Igreja no dia de
Pentecostes com o apoio da minha família e comecei a procurar trabalho.
Muita coisa mudou desde então. Eu conheci Jackie no site
CatholicMatch.com naquele mesmo Junho. Casei com ela um ano depois e
comemoramos o nascimento da nossa filha Evelyn em 3 de Março de 2014. Vivemos
agora no Estado de Indiana e eu estou feliz no meu novo trabalho.
Ainda sou novato nesta jornada católica. Para todos os
que ainda se questionam, eu posso dizer que o meu relacionamento com Deus só
tem se aprofundado e fortalecido. Enquanto vou-me envolvendo com a paróquia, me
vejo muito grato pelo amor à evangelização e à Bíblia que aprendi no
protestantismo.
Não acho que eu tenha abandonado a minha fé anterior,
mas sim que eu consegui preencher as suas lacunas. Hoje eu dou graças a Deus
por ter recebido a plenitude da fé católica.
____________
*Em substituição
do termo original do texto, “laptop”, para melhor compreensão de todo o leitor
português (espero que “laptop” seja o termo que designa, de facto, computador
portátil).
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